(re) Construir uma espadeladora de linho

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À esquerda, linho moído, ainda com muita palha. À direita, linho semi-espadelado na espadeladora / On the left, broken flax with a lot of tow. On the right, semi-scutched flax done on our prototype.

À esquerda, linho moído, ainda com muita palha. À direita, linho semi-espadelado na espadeladora / On the left, broken flax with a lot of tow. On the right, semi-scutched flax done on our prototype.

 

Quem me conhece mesmo bem, sabe que não ando aqui pela tradição. Ando aqui porque acredito que é possível produzir de forma mais consciente e sustentável a todos os níveis e que essa produção mais consciente depende, em grande parte, da possibilidade de reduzirmos a escala e tirarmos partido dos recursos locais.
Infelizmente, os meios de produção em pequena escala sofreram um grande desbaste nas últimas décadas e, na maior parte das vezes, controlar os meios de produção já não está ao nosso alcance. Não está tecnicamente ao nosso alcance: não há equipamento, o conhecimento é escasso e recuperar ambas as coisas é uma empreitada que poucos estão dispostos a levar a cabo. É por isso que um dos maiores focos do meu trabalho é reunir conhecimento. Não para o manter como alguns acham que sempre foi, mas para que quem também acredita nisto possa pegar nele e usá-lo para criar alternativas às fontes de consumo que temos actualmente.

E eis que chegamos ao linho, uma das fibras que mais gosto de semear e ver crescer, mas que me provoca um pouco de angústia quando tenho de a processar. Não tenho problemas em ripá-lo. Para o quebrar tenho acesso a vários dos poucos engenhos de linho que ainda funcionam no nosso país. Mas tudo pára (ou pelo menos abranda muito) quando tenho de o espadelar. Tal como me recuso a maçar o linho para o partir (a não ser que seja para uma pequena demonstração), ter de o espadelar à mão nunca me caiu muito bem. É um trabalho lento, pouco rentável e fisicamente muito exigente. O pior é saber que já existiram alternativas perfeitamente simples e produtivas para fazer esta tarefa: as espadeladoras. Uma espadeladora está para a espadela e espadeladouro como a roda de fiar está para o fuso.
O problema é que praticamente já não existem pequenas espadeladoras e as únicas duas que conheço (esta e esta) foram construídas para uma variedade de linho muito maior que a variedade regional que cultivamos e, portanto, é inútil para usar no linho galego.

Depois de 2 anos consecutivos a cultivar linho em quantidade já apreciável decidi que não voltava a espadelar tanto linho à mão (mais uma vez, a não ser que seja para uma pequena demonstração).
Na verdade já tinha percorrido tudo à procura de uma máquina destas que estivesse escondida ou encostada em algum museu cá em Portugal. Talvez funcionasse igualmente bem e não teria de investir tempo e dinheiro a reconstruir conhecimento, mas não encontrei nada.

A dificuldade em construir uma espadeladora nova estava também em encontrar alguém que não só reunisse os conhecimentos técnicos necessários, mas que gostasse genuinamente de construir coisas diferentes. Sorte a minha, o Hugo tinha acabado de começar o projecto dele dedicado a construir coisas. Todo o tipo de coisas, especialmente máquinas e também espadeladoras. É que rodas de bicicletas e rodas de espadelar têm muito em comum, afinal.
Portanto, uns meses depois de lhe fazer o meu pedido, tenho uma espadeladora que, apesar de ainda ser um protótipo, roda suavemente com os seus rolamentos do séc.XXI e faz muito bem o trabalho que lhe compete, com zero esforço físico da minha parte.

A versão final é suposto ter pedal e o suporte para o linho de posição ajustável, além de ser desmontável para poder viajar para as oficinas do linho, mas tal como está já me deixa muito feliz!

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